Os nomes novos

Poesia Pública é uma iniciativa do Museu e Bibliotecas do Porto comissariada por Jorge Sobrado e José A. Bragança de Miranda. Ao longo de 50 dias publicaremos 50 poemas de 50 autores sobre revolução.

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Na primeira manhã da revolução
todos os nomes mudaram. As tuas mãos
eram pássaros os teus braços asas
os teus lábios átrios de canções que sobrevoavam
alegrias irrecusáveis. Os milagres sucediam-se
sem qualquer comando divino. Os desapossados
de tudo eram providos da maior esperança. As flores
não murchavam. Os peixes multiplicavam-se
na brasa diária dos afectos. Nas manhãs seguintes
acordávamos sempre à espera da queda
de mais um velho costume repressivo. A garganta
habitava todas as palavras que lutavam
contra os velhos saberes quantitativos
que só perguntavam quantos dólares tem um lucro
ou quantos litros tem um almude. Trocámos o nome
das praças das pontes e das avenidas. Levantámos
as cabeças curvadas com vozes ao alto. A Utopia
do Bem e da Equidade invadia-nos o peito
e nenhuma morte se atrevia a silenciar
este novo país contaminado de Futuro.


Inês Lourenço nasceu no Porto, onde se licenciou em LLM (Estudos Portugueses) na FLUP. Publicou cerca de dúzia e meia de livros de poesia e microficção. Traduzida em várias línguas, fundou os cadernos de poesia HÍFEN (1987-1999). Foi distinguida, em 2023, como poeta, com a medalha de mérito pela Câmara Municipal do Porto.

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